A indústria no Grande ABC: uma pauta urgente

Por Gisele Yamauchi* e Andréa de Oliveira Tourinho**

A região do Grande ABC vem assistindo a uma sequência de fechamento de fábricas e transferências de linhas de produção de empresas nos últimos trinta anos. Em 2021, nossa pesquisa (assinada por Gisele Yamauchi sob orientação de Andréa Tourinho), identificou 308 áreas industriais ociosas no Grande ABC, que não cumprem qualquer função social. Os galpões ociosos são de pequeno (entre 5.000m² e 6.999m²) e médio (entre 7.000m² e 9.999m²) portes, bem como novas e antigas áreas de grande porte (a partir de 10.000m²).

Gisele é economista e doutoranda em Arquitetura e Urbanismo | Foto: Arquivo pessoal

São muitas áreas que poderiam receber algum tipo de atividade econômica, com base em um plano estratégico econômico-territorial e socioambiental, mas, devido à falta de panejamento, somada à complexidade de resolução da problemática, pois envolve multiescalas e multi-atores – as oportunidades vêm sendo perdidas. Ou seja, é preciso revisitar os projetos regionais do passado, aprender com os erros, resgatar a experiência vivida e avaliar o que não se fez, assim como conhecer situações semelhantes em outras cidades do Brasil e do exterior.

Na medida em que não surgem novas funções econômico-sociais para essas áreas, mais são os ônus que recaem sobre as cidades, com problemas cada vez mais complexos: a) ambientais – problemas de saúde pública, de contaminação e de deterioração material, que vão inviabilizando a reutilização das áreas ociosas; b) econômicos – falta de empregos e de recursos advindos do pagamento de impostos, perda de geração de riqueza e de complexidade tecnológica de produção de produtos e serviços; c) social – diminuição da renda e dificuldades na manutenção das famílias, entre outros.

Nesse contexto, considerando a importância da manutenção da centralidade industrial e a concepção de novos usos na região, e caminhando além do modelo de intervenção urbana baseado em shopping centers, supermercados, torres residenciais e de negócios, apontaremos, a seguir, algumas ações fundamentais para discussão no ABC:

Andréa é professora de Arquitetura e Urbanismo | Foto: Arquivo pessoal
  1. Constituição de um Fórum Regional da Indústria, com diálogo constante entre os representantes de cada setor, buscando fomentar e cumprir os objetivos e metas em prol da centralidade estratégica industrial em curto, médio e longo prazos.
  2. Conhecer os tipos de indústrias existentes, aferir as suas conexões, por meio de um inventário industrial sistemático, e discutir a inserção de novos setores estratégicos de produção na região, vinculando-os com os setores já existentes.
  3. Conformação de um modelo tríplice hélice entre universidades, empresas e poder público:
    • Criação de um Observatório Regional e/ou um Arranjo Produtivo Local de Dados com as universidades, por meio do fomento do Governo do Estado de São Paulo;
    • Estímulo à sinergia, aproximação e interação entre as tradicionais e as novas
    formas de organização empresarial, por meio de parcerias entre as universidades, startups, SEBRAE, CIESPs e outras instituições;
    • Debater sobre a formação, qualificação e realidades dos setores público e
    privado;
    • Fomentar parcerias entre as instituições, principalmente de nível estratégico
    regional, estadual e nacional, envolvendo novos setores e tecnologias.
  4. Chamar a atenção do setor público em relação à realidade das áreas industriais ociosas (situação física, fiscal e características) e fomentar incentivos para usos visando atividades econômicas tradicionais e novas, principalmente de produção industrial:
    • Verificar as características das áreas industriais ociosas: contaminação, deterioração, oportunidades de aproveitamento e pendências fiscais e tributárias
    para apontar as ações específicas para cada uma;
    • Levantamento, pelas prefeituras, das áreas industriais ociosas que possuem
    grande endividamento de IPTU, e, com os instrumentos de política urbana, apoiar a sua conversão em equipamentos públicos ou a criação de Hub de Inovação.
    • Observar as dinâmicas imobiliárias de atividades econômicas, como os
    condomínios industriais ou imóveis com função produtivo-residenciais, e verificar formas de estímulo;
    • Fomento de incentivos, pelo poder público, e de escuta constante das demandas das associações ou polos industriais e dos CIESPs, objetivando melhorar o diálogo e agilizar as ações de manutenção de infraestrutura local;
    • Aproximar os setores imobiliário, empresarial, de empreendedores e o poder
    público para fomentar atividade econômica nas áreas ociosas e debater a questão da especulação e do valor de vendas e aluguéis;
    • Verificar os ajustes, mudanças e/ou adequações nos planos diretores, inclusive
    de zoneamentos, para que não estimulem uma imediata evasão da indústria;
    • Aferir os conflitos existentes entre indústrias e residências, que podem resultar
    na expulsão da indústria de um local.

As propostas são necessárias e poderão se transformar em boas práticas estratégicas de ação, diálogo, interação e negociação entre os atores sociais para que a região do Grande ABC continue em desenvolvimento.

*Gisele Yamauchi é economista e doutoranda em Arquitetura e Urbanismo da Universidade São Judas Tadeu

**Andréa de Oliveira Tourinho é arquiteta e urbanista e professora doutora do programa Stricto Sensu em Arquitetura e Urbanismo da Universidade São Judas Tadeu

6 de maio de 2022