FRATERNIDADE E AMIZADE SOCIAL

Por Dom Pedro Carlos Cipollini*

As notícias sobre os conflitos que permeiam nossa sociedade estão presentes nos noticiários. Tomemos como exemplo as manchetes do corajoso Diário do Grande ABC, sempre disposto a cumprir seu propósito de estar vigilante em favor da justiça e defesa da população. Estas são de janeiro: “Motorista de ônibus é feito refém; Trânsito causa 254 mortes em 2023; Grande ABC fecha 2023 com alta nos crimes contra a vida; Denúncia de violações de direitos humanos cresceu 30% na Região…”

Nosso progresso técnico-científico avançou demais, mas as relações humanas não o acompanharam. Por isso, a Igreja Católica durante a Quaresma, que se aproxima, vem propor reflexão a partir da fé em Jesus Cristo, sobre nossas relações humanas na sociedade. Que sejam mais de acordo com o mandamento de Deus: “Amai-vos uns aos outros”.

O tempo da quaresma é tempo oportuno para se viver a conversão pedida por Jesus: “Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15). Esta conversão não pode ser apenas interna e individual, mas também externa e social. Os cristãos são convidados a tomarem iniciativas concretas para realizar ações que testemunhem a comunhão e a solidariedade a nível pessoal e social.

O tema da Campanha da Fraternidade deste ano é “Fraternidade e Amizade social” e o lema: “Vós sois todos irmãos e irmãs” (cf. Mt 23,8). Inspira-se na encíclica Fratelli Tutti do papa Francisco, a qual é uma proposta firme de responsabilidade coletiva, para viver a fraternidade e a amizade social, e combater os males que nos assolam, quais sejam: violência, solidão, guerras, desagregação social. São muitos os males que pesam sobre a família humana.

É preciso aceitar o convite para se viver na sociedade um amor que ultrapassa as barreiras geográficas e o espaço. Isto exige o desarmamento geral dos corações, das mentalidades e, sobretudo, o desarmamento bélico que faz funcionar as muitas guerras em curso no mundo, o qual vive uma “terceira guerra mundial em pedaços…”

Precisamos corrigir as situações de inimizade que geram divisões e destroem a dignidade dos filhos e filhas de Deus. É preciso deixar-se iluminar por Jesus Cristo que nos quer unidos como família, no resgate do sentido das relações humanas baseados no respeito e na reciprocidade do bem comum.

Enfim, é necessário “alargar a tenda” como diz o profeta Isaías (cf.cap.54,2) e promover transformações sociais em busca de uma sociedade amiga, justa, fraterna e solidária. Se quisermos sobreviver como sociedade pacífica, devemos ir além dos grupos de amigos e construir a “amizade social”, tão necessária à boa convivência no diálogo e proximidade.

 A amizade é o modelo de todas as relações humanas pessoais, familiares, políticas e espirituais. A amizade, este sentimento de respeito e estima entre as pessoas, é um dom de Deus, mas é também construção nossa. É um caminho de humanização e renovação das relações sociais.

Amizade social é amor que ultrapassa as barreiras, é fraternidade aberta para abraçar a todos, livre do desejo de dominar. É o amor que se estende para além das fronteiras incluindo todo ser vivo, ela rompe as cadeias que isolam para construir pontes. Enfim, é nossa vocação para formar comunidade de irmãos que se acolhem mutuamente e cuidam uns dos outros. Este é o sonho da humanidade, mas antes é o sonho de Deus.

A amizade como uma virtude política, é necessária para o bem viver na sociedade. Do contrário é a guerra de todos contra todos, pois as pessoas acabam sendo lobo umas para outras, como dizia Plutarco, sábio da Grécia antiga: “homo homini lupus”.

*Dom Pedro Carlos Cipollini é bispo de Santo André.

16 de fevereiro de 2024